Contemplativo
Uma firme convicção dinamizava a vida do Padre Usera: “a certeza de que Jesus Cristo o ama”. Essa profunda experiência de se sentir amado por Deus, emergia dos gestos de amor e carinho com que era acolhido, escutado com ternura e orientado humana e espiritualmente, no seio familiar. Foi este ambiente rico de afetos e tão harmonioso que fez despertar em Jerónimo Usera e, mais tarde, cimentar a dimensão contemplativa que tanto marcou a sua vida e viria a impregnar a espiritualidade das suas Religiosas.
Ao ingressar no Mosteiro Cisterciense, aos 14 anos, o seu coração estava preparado para saborear as interpelações do Espírito e consolidar a verdadeira arte da contemplação.
O silêncio do claustro, a harmonia da natureza, a oração pessoal e comunitária, juntamente com uma séria formação teológica e científica foram os ingredientes que alicerçaram o homem contemplativo em que Jerónimo Usera se tornou. Um homem com coração e mente reconciliados, capaz de ver tudo com e desde o coração de Deus.
Viver do Deus-Amor e testemunhar esse mesmo Amor com a sua vida e ação, eis a força tratora que estruturou a vida de Jerónimo Usera e faz dela uma chamada capaz de nos galvanizar para os horizontes do amor inclusivo e gratuito.
Humanista
A perspetiva humanista do Padre Jerónimo Usera, expressa-se em múltiplas formas e projetos convergindo todos eles para elevar o homem à dignidade de Filho de Deus. Trata-se de um humanismo encarnado e transformador que pretende levar os homens a viver como irmãos no que hoje poderíamos apelidar de “fraternidade universal” (Papa Francisco).
O humanismo do Padre Usera é teocêntrico, porquanto coloca Deus no centro de toda a atividade histórica de promoção e dignificação da pessoa. Ele está convencido que “O homem leva Deus no fundo do seu coração” (Venerável padre Jerónimo Usera).
Esta dimensão humanista do Padre Usera é indissociável da sua perspetiva antropológica, ou seja, ele concebe o homem como um ser “perfeitíssimo a quem Deus criou à sua imagem e semelhança” (Venerável Padre Usera) e que está chamado a ser feliz, autónomo, livre e comprometido na construção de uma sociedade alicerçada nos valores cristãos. O Padre Usera enfatiza que o ser humano é portador de valores, mas estes valores precisam de uma educação integral para serem impulsionados para o bem comum.
Descobrir o que há de melhor na pessoa, a sua positividade, a sua diferença, a sua capacidade de se superar, doar e de se comprometer com a verdade e o bem são desafios sempre a desenvolver. Estas competências exigem a criação de ambientes que capacitem a pessoa a tornar-se protagonista do seu próprio crescimento e a desenvolver e estabelecer relações harmoniosas com as pessoas e a natureza e sobretudo a viver em comunhão com o Deus Amor.
Missionário
A vida de Jerónimo Usera é uma constante abertura à surpresa, à novidade do Espírito. Assim o confirma o novo desafio que se lhe apresenta, o das missões. Um novo horizonte que tem o seu início com a chegada dos dois africanos guineenses, a Madrid: Quir e Yegue. O Governo, confia-os a Jerónimo por ser uma pessoa que prima pela excelência da educação, para que se responsabilize pela formação humana, social e religiosa dos dois jovens.
Mais uma vez somos surpreendidos por este homem de caráter humilde e bondoso, mas de grande sabedoria que com a força da caridade prende o coração daqueles que lhe são confiados. O Padre Jerónimo Usera começa por se tornar “discípulo” dos dois jovens. Escuta-os, aprende a sua língua, tenta compreender a sua cultura e só depois partilha com eles os seus conhecimentos e os educa na fé cristã. Coloca-se inteiramente na ótica da outra pessoa. E para que a sua ação capacitasse os destinatários para a autonomia e liberdade, produz um conjunto de obras não apenas ilustrativas da vida daquele povo mas, sobretudo, didáticas e doutrinais.
“A Memória de Fernando Pó, o Ensaio Gramatical, o Pequeno Dicionário, o Catecismo para os Ilhéus de Fernando Pó e o que Ele compôs em idioma congo para os escravos das plantações de Porto Rico, ambos perdidos, são prova evidente do compromisso pessoal de Jerónimo para se fazer discípulo do povo africano pobre e oprimido e adquirir o instrumento-chave para compreender o seu mundo natural, a língua.” (Manuel Gómez Ríos, in Testemunha do amor para o terceiro milénio, pág. 105)
É do encontro com estes dois jovens que nasce uma nova etapa na vida de Jerónimo. Deixa a universidade rumo a um novo continente: África e, com esta viagem, emerge a sua paixão pelas missões, paixão que ele expressa do seguinte modo: “o pensamento das missões é o maior que pôde Deus inspirar aos homens”; “O missionário é o enviado do Filho de Deus, que anuncia a paz e difunde a caridade, e oferece felicidade e ventura aos que o escutam, e reserva para si os padecimentos”. (Venerável Padre Jerónimo Usera).
Pedagogo
O Padre Jerónimo Usera não deixou um tratado de pedagogia, propriamente dito, como acontece com a maioria dos pedagogos tradicionais. Porém, de entre os seus diversificados e valiosos escritos, extraem-se dados suficientes para corporizar um sistema pedagógico repleto de atualidade e colocar a sua pessoa, sem qualquer reserva, ao lado daqueles homens e mulheres que acreditam que a educação é o maior segredo da transformação da humanidade.
Antes de salientar qualquer um dos pressupostos pedagógicos do Padre Usera, é imperioso recordar que a sua pedagogia decorre da sua conceção antropológica do ser humano, conceção esta, que foi enfaticamente narrada, com a sua vida e ação.
Há 157 anos atrás (1864) o Padre Usera, emerge no âmbito das ciências da educação como um autêntico visionário, um precursor da “educação positiva”, conceito hoje em discussão, que se baseia na urgência de conhecer a criança ou jovem, individualmente, demonstrando-lhe que o educador a ama acima de tudo.
O primado da afetividade e a coerência do educador, são dois eixos que articulam com outros princípios que configuram e fazem da pedagogia useriana, uma realidade deslumbrante e apaixonante para quantos a conhecem e lhe dão vida, transportando um património histórico-carismático que, entre outros ensinamentos, promove a verdade e o bem, a sabedoria e a santidade, a bondade e a benevolência, o respeito e a fraternidade universal. Neste caminho um slogan nos irmana e fortalece: Educar em Amor, por Amor e para o Amor”.
Fundador
Esta é uma etapa da vida do Padre Usera onde encontramos um homem, de grande interioridade e envergadura espiritual, com uma vasta experiência de vida que lhe permite perceber que o melhor bem que pode prestar à sociedade é o da Educação.
Mergulhado nas diferentes problemáticas das Antilhas, falta de resposta educativa, pobreza, escravatura, falta de reconhecimento do valor da mulher, crianças desprotegidas, o Padre Usera sonha uma educação integral, inclusiva, diferenciada, onde todos possam ser agentes do seu próprio crescimento. e tomem consciência da sua dignidade. Para pôr em marcha este projeto, funda a Congregação Religiosa das Irmãs do Amor de Deus, a 27 de abril de 1864, em Toro, na província de Zamora, Espanha. Esta intuição que lhe pesava tanto na cabeça como no coração foi emergindo à medida que lia a realidade e contemplava as interpelações de Deus face à mesma.
A fundação é fruto da constatação da realidade sofredora das Antilhas, da leitura dessa mesma realidade à luz do Evangelho em confronto com os seus pressupostos pedagógicos e antropológicos, num discernimento aturado e sobretudo da sua grande convicção de que deve ser restituída à pessoa a sua dignidade de Filha de Deus.
O Padre Usera, soube ler a realidade e fazer dela uma oportunidade integradora, ultrapassando as barreiras que cativam o homem na incultura, na ignorância e na inconsciência da sua dignidade.
Acreditando que transportamos um imenso património educativo-evangelizador, legado por Jerónimo Usera hoje, Irmãs e Leigos sentimo-nos chamados a ampliar esta narrativa e a contá-la às gerações de hoje, manifestando-lhes que amamos cada pessoa acima de tudo.